Saúde
Proteína e saúde: o risco do “mais é melhor”
Em dietas muito hiperproteicas, especialmente quando a maior parte vem de carnes gordas e processadas, há um aumento de carga metabólica para rins e fígado e, a longo prazo, um ambiente menos favorável ao coração. A literatura descreve, por exemplo, hiperfiltração renal e a necessidade de atenção especial em quem já tem alguma condição prévia. Para o coração, o debate não é apenas “quantidade”: a fonte conta.
Diretrizes atuais reforçam a redução de gorduras saturadas no conjunto da dieta e estudos observacionais consistentes associam maior consumo de carnes vermelhas, sobretudo processadas, a risco elevado de doença cardiovascular e diabetes tipo 2 ao longo do tempo.
Quanto é “suficiente”?
Para adultos saudáveis e pouco ativos, algo em torno de 0,8 g/kg/dia costuma atender ao básico. Para quem treina com regularidade, a faixa útil costuma ficar entre 1,2 e 2,0 g/kg/dia, dependendo de objetivo, volume e intensidade do treino; acima disso, os ganhos tendem a diminuir e os efeitos colaterais (digestivos, renais, financeiros…) aumentam. A distribuição ao longo do dia também importa: doses moderadas por refeição favorecem melhor aproveitamento do que concentrar tudo à noite. Passados os 60 anos, muitas pessoas se beneficiam de uma meta um pouco maior, 1,0–1,2 g/kg/dia, para mitigar a perda de massa e força; casos específicos chegam a 1,2–1,5 g/kg/dia com acompanhamento.
Aqui entra o ponto central: não existe uma conta única para todos: idade, rotina, treino, histórico clínico e preferências alimentares mudam o alvo.
Se a fonte faz diferença, variar é regra. Combine proteínas animais magras (peixes, frango sem pele, laticínios com menor teor de gordura, ovos) com proteínas vegetais de verdade (feijões, lentilha, grão-de-bico, tofu, edamame, castanhas e sementes). As trocas parciais por vegetais, ao longo da semana, aparecem associadas a melhor perfil cardiometabólico e menor mortalidade em coortes de longo prazo. Esse “mosaico proteico” também traz fibra, micronutrientes e saciedade com menos gordura saturada, o que interessa para quem busca saúde no longo prazo sem radicalizar a dieta.
Outro elo pouco lembrado é a hidratação. Metabolizar proteína gera ureia; água adequada ajuda o rim a fazer seu trabalho. Como referência geral, mulheres costumam mirar algo próximo de 2,0 L/dia e homens 2,5 L/dia (de bebidas e alimentos), ajustando para clima, suor e treino.
Não precisa transformar isso em obsessão: observe a cor da urina (clara, sem cheiro forte) e a sensação de sede ao longo do dia.
Antes de “turbinar” o prato, faça três perguntas simples: qual é a minha faixa ideal agora (considerando peso, treino, idade e exames)? Como estão as minhas fontes (há espaço para mais vegetais e cortes magros e para reduzir processados)? Estou hidratando de forma consistente? Se a resposta a alguma delas for “não sei”, vale buscar orientação profissional, principalmente se houver histórico renal, hepático ou cardiometabólico na família. Sinais práticos de que pode haver excesso ou desequilíbrio incluem desconfortos gastrointestinais frequentes, cansaço fora do usual, urina muito escura/escassa e exames alterados (ureia/creatinina, perfil lipídico).
Não é para criar alarme: é para ajustar.
No fim, saúde não nasce de extremos. Ela se constrói com escolhas inteligentes repetidas ao longo dos dias: proteína sim, com bom senso; um prato que combine qualidade da fonte com variedade, vegetais em abundância e gorduras boas; água sempre por perto; e um olhar realista para o seu contexto, não para a régua alheia.